A constante evolução dos mercados e o consequente aumento da concorrência e competitividade, aliados às constantes alterações legislativas, impõem às empresas inúmeras exigências. Assim, uma gestão eficiente de todos os recursos assume um papel preponderante no objetivo central das empresas – a obtenção de lucro. Um exemplo dos inúmeros recursos a gerir são os inventários. Uma condução eficiente dos mesmos poderá evitar custos com a aquisição e manutenção de quantidades excessivas, as quais, se não forem evitadas, incrementam o risco de desvalorização e obsolescência. Inversamente, uma insuficiência de inventários, em momentos “chave”, poderá resultar em ruturas de stocks e, consequentemente, na perda de receitas.
Para além dos referidos riscos, não poderemos deixar de mencionar o peso que os inventários assumem no ativo das empresas, com maior expressividade em determinados setores de atividade. Desta forma, parece inequívoco que uma correta gestão dos inventários desempenha um papel vital no desenvolvimento e eficiência financeira das empresas.
É neste contexto que se impõe à contabilidade das empresas um papel preponderante no apoio à gestão, nomeadamente aquando da implementação do sistema de inventário e das políticas de valorimetria.
Em termos contabilísticos, os inventários são ativos. Ora, de acordo com a Estrutura Concetual (EC) do Sistema de Normalização Contabilístico (SNC), ativos são recursos controlados pela entidade, em resultado de acontecimentos passados e dos quais se espera que fluam benefícios económicos futuros.
No que respeita aos ativos, as normas contabilísticas impõem critérios adicionais para que se proceda ao seu reconhecimento e mensuração, como inventários. Assim, em termos contabilísticos, importa salientar que os inventários são ativos:
a) Detidos para venda no decurso ordinário da atividade empresarial;
b) No processo de produção para tal venda; ou
c) Na forma de materiais ou consumíveis a serem aplicados no processo de produção ou na prestação de serviços.
Neste sentido, quando nos encontramos perante inventários, os registos contabilísticos devem possibilitar o:
- Conhecimento a qualquer momento das quantidades e valor dos stocks que a empresa detém; e
- Apuramento do custo dos produtos vendidos e consumidos e, consequentemente, do resultado apurado nas vendas ou na produção. Para alcançar tais objetivos será possível adotar o sistema de inventário permanente ou o sistema de inventário intermitente ou periódico.
Sinteticamente, diremos que o sistema de inventário permanente é um método de gestão, no qual é efetuado um registo contínuo e atualizado das quantidades em armazém. Teoricamente, a entidade deve conseguir determinar o valor dos inventários existentes e efetuar os respetivos registos contabilísticos a “qualquer momento”.
Em sentido oposto, o sistema de inventário periódico permite que os registos sejam realizados em intervalos de tempo fixos.
Em termos legais, no período de 2016 verificou-se um alargamento do universo das entidades obrigadas à adoção do sistema de inventário permanente, o qual resultou da transposição para a ordem jurídica nacional de diretrizes europeias.
Atualmente, as entidades abrangidas pelo SNC ou pelas normas internacionais de contabilidade, adotadas pela UE, estão obrigadas à adoção do sistema de inventário permanente. No entanto, ficam dispensadas da sua adoção as microentidades e alguns setores de atividade como a agricultura, empresas de prestações de serviços e o pequeno retalho.
Consideram-se microentidades as entidades que, à data do balanço, não ultrapassem dois dos três limites seguintes:
- Total de balanço: 350.000 euros;
- Volume de negócios: 700.000euros; e
- Número médio de empregados durante o período.
Estes limites reportam-se ao período imediatamente anterior. Caso dois dos três limites sejam ultrapassados, em dois períodos consecutivos, a entidade deixa de ser considerada como microentidade, a partir do terceiro período, inclusive.
De acordo com o SNC, as entidades obrigadas à adoção do sistema de inventário permanente deverão adotar os seguintes procedimentos na sua contabilização:
a) Proceder às contagens dos inventários com referência ao final ou ao longo do período, de forma rotativa, de modo que cada bem seja contado, pelo menos, uma vez;
b) Identificar os bens quanto à sua natureza, quantidade e custos unitários e globais, por forma a permitir a verificação, a todo o momento, da correspondência entre as contagens físicas e os respetivos registos contabilísticos.
No parecer5 da Comissão de Normalização Contabilística (CNC) é referido que o sistema de inventário permanente não é um instrumento que integre o SNC, mas antes uma obrigação legal aplicável às entidades que apliquem o SNC.
Esclarece ainda a CNC que a aplicação do sistema de inventário permanente na escrituração comercial digráfica tem em consideração a prática corrente na realidade das empresas. Esta prática pode basear-se em registos extra-contabilísticos, suscetíveis de permitirem o controlo da correspondência entre os registos contabilísticos e os valores apurados, com base nas contagens físicas dos inventários. Verificamos, então, que as informações para a realização dos registos contabilísticos podem ser obtidas através dos sistemas de controlo e gestão de stocks (informáticos ou manuais), de documentos como gasto das vendas (CMVMC ou variação dos inventários da produção), bem como de resumos dos documentos, nos quais conste o custo de produção dos diversos produtos e dos produtos e trabalhos em curso que transitam para o período seguinte, referente ao período em causa(mês), e no final do ano.
A CNC sublinha que a periodicidade do registo contabilístico, em sistema de inventário permanente, não está legalmente estabelecida, devendo atender-se à natureza das atividades desenvolvidas pela entidade e a uma análise da relação custo-benefício.
A este propósito, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) emitiu um ofício circulado no qual conclui que é aceitável, para efeitos fiscais, que o registo contabilístico seja efetuado, pelo menos, no final de cada mês.
O Código do IRC estabelece, ainda, que não são permitidos atrasos na execução da contabilidade superiores a 90 dias, contados do último dia do mês a que as operações respeitam. De salientar que, de acordo com a estrutura atualmente prevista para a submissão do ficheiro SAF-T (PT) da Contabilidade, é possível verificar, “a posteriori”, se os registos contabilísticos estão a ser realizados nas condições e prazos respetivos.
No que respeita à contagem física, importa relembrar que as entidades que disponham de contabilidade organizada e estejam obrigadas à elaboração de inventário, devem comunicar à AT por transmissão eletrónica de dados, até ao dia 31 de janeiro, o inventário respeitante ao último dia do exercício anterior.
Por fim, em resultado da publicação do Orçamento do Estado para 2024, o Governo determinou a dispensa da obrigação de valorização dos inventários, aquando da sua comunicação, relativamente ao período de tributação de 2023, para todos os sujeitos passivos.
Adicionalmente, e no que se refere ao período de tributação de 2024, apenas os sujeitos passivos obrigados à utilização do sistema de inventário permanente estão incumbidos de tal comunicação.
Assim, a avaliação da adequação da legislação fiscal em relação aos procedimentos exigidos deve considerar a capacidade de as empresas cumprirem esses requisitos de forma eficiente e eficaz.